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the old soul girl

the old soul girl

03
Mai24

Quando a terapeuta vai à terapia #1

girl

Se há tema no qual me sinto uma verdadeira impostora, é no que diz respeito à terapia. Casa de ferreiro, espeto de pau; faz o que eu digo e não o que eu faço; são alguns provérbios que ilustram tão bem a minha relação com a ideia de fazer terapia. Sei que faz tão bem, sei que pode fazer a diferença na vida de qualquer pessoa e, ainda assim, no que me concerne, andei a mastigar a ideia de forma ruminativa, sem nunca avançar. Entreguei-me a vários argumentos que justificavam a minha inércia e fui escrevendo esta vontade nos meus objetivos anuais, nas transições de vários anos, quando somos invadidos por aquela súbita e misteriosa força motivadora de mudar a vida num ápice. 

Mesmo sabendo que a terapia é umas das melhores ferramentas que podemos ter na nossa caixinha de utensílios para fazer face aos desafios da vida, sempre temi sentar-me do outro lado da secretária. Tive medo de me abrir com alguém que não soubesse acolher-me, a mim e às minhas dores, às minhas fragilidades e questões. Tive receio de ser vulnerável com alguém desconhecido, cuja atenção está só e somente focada em mim, não me dando escapatória e não me permitindo nenhuma saída de emergência. Precisamente por conhecer a terapia tão de perto, por dentro, tive receio de não ser capaz. Mesmo sabendo que, do outro lado, existe um profissional treinado para saber ouvir e escutar, ler nas entrelinhas, procurar significados, relacionar acontecimentos e iluminar padrões escondidos e subterrados. É uma daquelas situações em que a lógica e a emoção não se casam e, por mais que o racional grite, o emocional parece sempre mais forte e vencedor. 
Um dia, da forma mais natural e espontânea do mundo, deparei-me com uma aplicação que providencia consultas psicológicas online e fiquei curiosa. Embora não goste nada de videochamadas e considere que não se consegue reproduzir a intensidade de uma presença física, de um espaço partilhado por duas pessoas, que se olham e escutam diretamente, achei interessante a possibilidade de fazer algo que tanto me assustava no conforto da minha casa, do meu espaço, com a distância de segurança devida. E achei ainda mais interessante a possibilidade de conciliar com a minha rotina, que é sempre tão preenchida. Decidi arriscar, movida pelo pensamento "vamos ver o que isto é, se não gostar, não preciso de continuar". E lá marquei uma sessão. 
Senhores, como eu estava nervosa para aquela primeira sessão! Só conseguia pensar em todos os meus clientes, os passados e os atuais, e na sua coragem para, semanalmente, se sentarem diante de mim e se abrirem comigo. Que honra ser merecedora dessa confiança, dessa entrega! Acho que suei mais naqueles instantes antecedentes ao início da sessão do que nas últimas caminhadas que fiz. 
Começou a sessão e eu, de forma automática e inconsciente, começo a tirar notas mentais do modo como a psicóloga me recebe e se apresenta. Começo a estudá-la e apercebo-me que ela espera que eu comece a falar acerca do motivo que me levou a marcar a sessão. Explico, de forma desajeitada e atrapalhada, numa tentativa de elaborar e, ao mesmo tempo, de não ser demasiado descritiva e aborrecida. Alterno entre o papel de cliente e o de psicóloga, colocando-me no lugar dela e pensando que será mais fácil quanto mais objetiva eu for, quanto mais clareza eu conseguir oferecer ao meu raciocínio. 
Ela pede-me para falar acerca das minhas primeiras memórias e, quando dou por mim, a sessão está a chegar ao fim e ela pede-me para identificar um sentimento que esteja presente depois de 50 minutos a falar acerca da minha trajetória de vida. Falo-lhe de um sentimento de leveza e de alívio. E de surpresa, por ter sido capaz de falar tanto e de forma tão honesta. Despedimo-nos, agendando a próxima sessão e desejando uma boa semana uma à outra. O ecrã desliga-se e vejo a minha reflexão no monitor. A sorrir, orgulhosa de mim, do passo que fui capaz de dar. Com a certeza, mais uma vez, de que a experiência é o melhor antídoto do medo. 
Desde dessa 1ª sessão, tenho feito um diário de terapia, onde vou escrevendo sobre as sessões, sobre as minhas reflexões pós consulta e os meus pensamentos em relação ao próprio processo terapêutico. Ajuda-me a organizar as ideias e a construir esta experiência; a decifrar melhor os meus ângulos mortos. Não sei se vou alcançar o objetivo terapêutico, mas sei que a cada sessão que compareço, que me apresento e me entrego, estou a dar o meu melhor. E isso é suficiente. Ser eu é suficiente. Ser é suficiente. 
Estou mais focada no processo do que no resultado. Mais do que alcançar o que me levou a marcar a consulta, estou a alcançar pequenas vitórias que não faziam parte do meu objetivo principal. Uma delas é, sem dúvida, permitir-me ser vulnerável, falar do que me preocupa, mostrar as minhas feridas sem vergonha, verbalizar o que vai dentro de mim sem ter de me preocupar se vou ferir suscetibilidades. Estas são conquistas que não posso negligenciar e parte desta jornada é estar consciente da relação que estabeleço comigo mesma. Em vez de ser a minha maior crítica, a inimiga nº1 de mim própria, estou a tentar ser genuinamente minha amiga e torcer por mim, aplaudir as minhas vitórias e incentivar-me, mesmo quando as coisas nem sempre correm como eu gostaria.
Há uma vozinha em mim que me diz que este não é o match perfeito e que a minha psicóloga não é exatamente o tipo de pessoa que eu procurava, mas estou a tentar ser paciente com ela também e com ambas. Uma relação não se constrói num só encontro, requer algum tempo e entrega, dedicação. Fiquei apreensiva quando, no início da 2ª sessão, me questionou, novamente, o nome próprio. Fez-me sentir ... esquecida? Invisível? Sei que pode parecer um pormenor pequenino e insignificante, mas talvez por também conhecer o lado de lá, de me sentar semanalmente na cadeira oposta à que me sento quando estou nestas sessões, é que senti um desconforto quando me fez esta pergunta. Poderia estar cansada, ter tido um dia, uma semana difíceis, é certo. Mas ... questionar o nome fez-me sentir pequena num espaço em que me deveria sentir à minha altura. 
Estou a tentar compreender se poderei estar a ser demasiado implacável ou se poderá existir aqui alguma razão de ser, que me possa levar a procurar outra pessoa, com quem sinta uma base mais sólida no que diz respeito à relação terapêutica. Por isso, estou a dar-me tempo, mantendo-me atenta a estas sinergias e dinâmicas.  
Para terminar este desabafo, deixo-vos com uma questão que, de quando a quando, me vou colocando e me ajuda a reorientar: se alguém falasse convosco como vocês falam convosco próprios, seriam amigos dessa pessoa? 
(Nem vou comentar nada sobre a ausência do blog, porque seria chover no molhado. Já se compreendeu que este lugar é como um caderno, um bloco de notas infinito, onde existe sempre uma folha branca disponível, à espera da composição frásica. Não é um diário, mas é um fiel companheiro. A todos vocês que me vão deixando comentários, sempre tão carinhosos, muito obrigada por continuarem aí )
14
Ago23

the art of mourning

girl

Alerta para um post advindo de um emaranhado de fios mentais, de um novelo de ideias dispersas e enroladas umas nas outras. Esta é uma tentativa de desfazer nós e esticar linhas de pensamentos. 

Estou há horas a tentar escrever alguma coisa decente. Penso, escrevo, apago. Torno a pensar, torno a escrever, torno a apagar. Vejo o desânimo apoderar-se de mim, sinto o cansaço nas minhas pálpebras, a desmotivação a instalar-se na minha postura corporal. Ouço os meus pensamentos, presto-lhes a devida atenção. Eles dizem-me que não tenho jeito nenhum para isto. Que não consigo elaborar e trabalhar esta ideia que me surgiu. Que esta desorganização mental é real e por mais que tente arrumá-la, há sempre alguma reflexão que fica de fora e obriga a repensar toda a ordem até então criada. Que trabalhar a uma segunda-feira, numa véspera de feriado deveria ser proibido e que, por esse facto, me posso entregar a uma dose de letargia. Que me apetece muito criar coisas, investir, inventar. Que isso é difícil e não sei por onde começar. Que quero a mudança, mas será que estou disposta a pagar o preço que ela custa? Será que é um bom investimento? Que me sinto aborrecida. E isto não é apenas um pensamento que me ocorre, é também toda uma emoção e sentimento em si mesmo. Que me sinto triste. E cansada. Que existem várias fontes de cansaço na minha vida, de diferente origem, mas que se completam e fortalecem esta sensação de desfalecimento quotidiano. Que me sabe tão bem dormir e ler. Que em ambas as atividades me distancio de mim, deste estado de consciência e navego para outros mundos, outras realidades, outras pessoas e possibilidades. Que sinto fome. E que devo comprar um chocolate para aguentar até ao fim do dia, pois vai ser longo. Que não trabalhei quase nada e o dia já vai a meio, mas que também não em preocupo muito com isso. Que se lixe.

Não era sobre nada disto que queria escrever. Mas talvez não seja sobre o que quero, mas sobre o preciso de escrever. Quero escrever sobre livros, podcasts, música; mas preciso de escrever sobre as minhas dores e os meus pensamentos sobre elas.

Dou por mim a refletir sobre o conceito de luto e, inevitavelmente, sobre o de perda. Parece-me que andam de mãos dadas, a cara e a coroa da mesma moeda. Para cada perda tem de existir um luto. Mas há tantas formas de perda. A mais comum, e das mais assustadoras, é a perda de alguém que amamos. Mas existem outras que não exigem uma ausência física, o que não significa que não impliquem uma ausência. Há perdas de expectativas, de sonhos, de projetos. Há perdas de pedaços de nós, há perdas da totalidade de nós. Há perdas de rumo, de sentido, de propósito, de missão. E no meio destas perdas todas, há tanto luto por trabalhar. Sim, o luto é um trabalho. Duro, ingrato, escravo, controlador, precário. Um trabalho para o qual é difícil arranjar candidatos, por maiores e melhores que sejam as promessas de condições de trabalho. Lembram-se daquela expressão horrenda que estava inscrita nos portões dos campos de concentração nazis, O trabalho liberta? Naquele contexto e naqueles moldes, o trabalho não libertava, matava. Mas nesta minha linha de raciocínio condicional, se o luto é um trabalho e se o trabalho liberta, então o luto é um trabalho que liberta.

E é mesmo. Por mais que custe, por mais que demore, por mais que pareça não ter fim, o luto liberta-nos. E eu vejo-me neste compasso de espera, de indecisão, de avançar ou de me encolher perante este processo. De um lado, vejo as minhas perdas empilhadas, acumuladas umas atrás das outras. Perdas simples, simbólicas, essencialmente de expectativas que nem sabia que tinha criado. O próprio mecanismo de proteção de não criar expectativas advém de uma perda maior, que me convenceu que não se pode perder nada que não se possua em primeiro lugar. Claro que esta aprendizagem (não) brilhante foi feita num momento de desilusão, de estilhaços de sonhos e fantasias no chão. Mas pior do que perder um sonho, é perder todos pela perda da capacidade de sonhar. Durante muito tempo confiei que esta era uma boa estratégia, mas já não estou convicta disso. Sinto saudades de sonhar e, num plano mais amplo e abrangente, sinto saudades de mim, de um “eu” onde sonhar era um prazer.

As nossas perdas não trabalhadas, não choradas não se extinguem. Não evaporam. Apenas se sedimentam, formando várias camadas, umas em cima de outras, que vão causando erosão na nossa identidade e nas nossas relações, com os outros e com o mundo. É isto que vejo do outro lado. Existe uma expectativa e existe a realidade; quando ambas coincidem, maravilhoso, quando ambas se contrariam, é preciso chorar essa contrariedade. É preciso mastigar (não ruminar) as emoções que daí surgem e aceitar esta conclusão, encaixando-a na nossa história, na narrativa da qual somos autores. Às vezes este processo é rápido, outras vezes não. Às vezes é difícil olhar para as emoções com aceitação, é difícil estar com o desconforto que elas provocam. E não faz mal, porque isso também é, em si mesmo, um processo. Outras vezes, é difícil a aceitação. Não queríamos determinado desfecho, não queríamos escrever determinado capítulo. Não faz sentido na visão que pretendíamos construir. E, mais uma vez, está tudo bem. Porque é difícil desvincular de uma ideia, de um projeto, de uma vontade. Por mais lógico e racional que seja esse processo de desvinculação, há qualquer cola invisível que nos une àquela ideia, aquela perspetiva. Mudar de óculos, de lentes, requer um período de habituação, não é verdade?

São estes pensamentos que têm pairado na minha cabeça desde manhã. Sei que ainda não trabalhei esta ideia como gostaria, falta-me sustentação, falta-me limar as arestas. Mas o essencial está cá. A ideia central está lançada no mundo: tenho perdas para chorar. Tenho trabalho para fazer. Tenho de olhar para dentro e desembaciar as lentes, que estão ofuscadas pelo medo de sentir. Sim, medo de sentir. Durante muito tempo, fui refém deste medo. Medo de abraçar as emoções, sejam elas quais forem, com os dois braços abertos, de coração para coração. Medo de não ser capaz de as gerir, de elas me esmagarem em vez de me abraçarem. Medo de me paralisarem e me bloquearem. Nunca fizeram tanto sentido as palavras de Carl Jung: o que resiste, persiste. É preciso deixar fluir, seguir o rumo da corrente e não remar em direção oposta. Essa resistência vai criar mais entropia, vai bloquear o ritmo normal e saudável da vida.

O pontapé de saída está dado. Começar a “partir pedra” e desmontar este muro que construi entre mim e as perdas. Afinal, fazemos parte da mesma matéria, partilhamos o mesmo berço. Eu não sou as minhas perdas, mas elas fazem parte de mim. Da minha história.

E depois deste momento de escrita caótico e catártico, os pensamentos continuam presentes, mas eu apenas os observo e contemplo. Que bela atividade mental que para aqui vai.

29
Jul20

surrender

girl

No dia em que me ligaram a confirmar a minha disponibilidade para o novo desafio que me tinha sido proposto, eu tinha acabado de fazer uma meditação guiada da Sarah Blondin, chamada Learning to Surrender.

Antes de avançar, quero apenas dizer-vos que a Sarah é, provavelmente, das melhores "professoras" de meditação que poderão encontrar. Todas as meditações dela são mágicas, a Sarah tem uma presença que emana tranquilidade e paz. Por isso, fica aqui o meu conselho para a irem pesquisar no Insight Timer, estou certa de que não se arrependerão. 

Retomando. Learning to Surrender. Surrender pode ser traduzido como rendição, entrega. Para mim, como tenho vindo a escrever, a capacidade de entrega, de deixar fluir, é uma aprendizagem contínua, porque toca na minha maior necessidade, que é a de controlo. Controlo e entrega não são compatíveis. Do mesmo modo que controlo e vida também não o são. Na verdade, há pouquíssimas, raras coisas que podemos controlar nesta nossa existência. Podemos controlar os nossos pensamentos (ou, pelo menos, a influência que estes têm sobre nós), os nossos comportamentos e emoções. Podemos controlar a forma como reagimos ao que nos acontece, mas nunca seremos capaz de controlar o que nos acontece. As alegrias e infelicidades da vida não são, muitas vezes, selecionadas por nós. Apenas nos resta ser capazes de lidar com elas da melhor forma possível, do modo que temos disponível naquele momento para enfrentar aquela situação. 

Hoje é o segundo aniversário da morte da minha família como sempre a conheci. Da família onde cresci, onde fui e fomos imensamente felizes. Não escolhi este desfecho, simplesmente aconteceu. Veio bater-me à porta, com uma força e urgência de quem não pede permissão para entrar. Gosto de pensar que tudo o que nos acontece tem o poder de nos transformar. Que tudo pode ser um presente. Mesmo que não venha embrulhado num papel colorido e seja apetecível. Na verdade, há oportunidades únicas de mudança que nunca olharemos como positivas, mas saberemos sempre que foram necessárias para o nosso crescimento. Esta é uma delas. Dificilmente olharei para este acontecimento como positivo, mas consigo extrair dele valiosas aprendizagens. Uma delas é precisamente sobre ser capaz de me render à vida. Aceitar tudo - o bom e o mau - resistindo cada vez menos à mudança. 

Quando me telefonaram, tinha acabado de ouvir a Sarah a dizer que entrega não é o mesmo que desistência. Não é algo passivo. Entrega é sermos capazes de fluir com a vida, de a seguirmos como a água segue o curso natural do rio, que segue o seu caminho ao oceano, fundindo-se num só. É sobre desconstruir resistências, porque tudo aquilo ao qual resistimos, apenas persistirá, como Jung nos ensinou. É sobre compreender, com a mente e o coração, de que o controlo é uma ilusão, de que quando deixamos de ter essa necessidade, podemos estar abertos, curiosos e disponíveis para todas as oportunidades que a vida tem para nós. A meditação acabou, eu ainda estava enfeitiçada por estas palavras mágicas, quando o telefone tocou e me fizeram a proposta oficial. Eu sei que ultimamente tenho falado muito acerca de sinais, mas naquele momento, não fui capaz de ignorar a mensagem. Quando nos propomos a abraçar a vida, com tudo que esta tem para nos oferecer, as coisas simplesmente acontecem. No meu caso, tive esta prenda, mas não me enganei, este é um presente que traz consigo uma dose enorme de desafio e crescimento, como vos tenho contado. Deixou-me muito feliz, mas rapidamente percebi que ia estremecer com todas as minhas inseguranças e defesas. A vida não tira sem nos dar nada em retorno, do mesmo modo que não nos dá, sem nos tirar algo também. É um fluxo contínuo, que não podemos contrariar. 

Por isso, escolho olhar para o dia de hoje como uma oportunidade de recomeço. De renovar pensamentos, de me desfazer de crenças e medos que não me acrescentam, apenas consomem. Somos responsáveis pela nossa vida e, como tal, pela nossa felicidade. Que nos esqueçamos de que somos detentores desse poder e, como tal, dessa responsabilidade. 

28
Jul20

trust

girl

Os sinais existem e estão presentes, basta estarmos atentos e, talvez o mais importante, estarmos recetivos. Hoje entro no meu computador de trabalho, iniciando sessão e abrindo o google chrome, que me recebe sempre com uma frase inspiradora para começar o dia em pleno. A frase que me abraçou hoje foi a seguinte:

Unless you try to do something beyond what you have already mastered you will never grow. - Ralph Waldo Emerson 

Esta citação resume na perfeição a fase que estou a viver. Estou perante um processo de aprendizagem enorme, que me está a desafiar a todos os níveis. Está a mexer com todos os meus medos e receios, com todas as minhas forças e fragilidades. Tenho momentos de confiança e, a seguir, começo a sentir o medo a espreitar, a aproximar-se e a sussurar-me ao ouvido "será que és mesmo capaz?". Sinto o entusiasmo, a adrenalina de me dedicar a algo que me enche tanto o coração e me faz sentir tão viva, mas, ao mesmo tempo, os velhos receios e os pensamentos negativos explodem diante de mim. Quero focar-me apenas no lado positivo, mas não existe luz sem sombra; esta experiência é um todo e, como tal, é também constituída por momentos de angústia no meio de tantos momentos de alegria e euforia. 

Olho para dentro de mim e vejo dois caminhos. Vejo o velho e conhecido caminho, aquele que me faz sentir segura, mas frustrada; que é reto, plano e não requer grande energia da minha parte para ser percorrido (porque, de tão velho que é, conheço-lhe cada milímetro e percorro-o de olhos fechados). E depois vejo um outro, que não está sequer finalizado, que brilha com muita intensidade, com tanta luz, que me ofusca e faz sentir tonta e desnorteada. É tentador, mas deixa-me apreensiva, o meu estômago enrola-se em si mesmo e sinto a minha garganta contorcer-se num nó cego. Por um lado, quero sentir-me segura e estável; por outro, quero a aventura, o desafio. Quero ambos os caminhos, quero se cruzem e formem um só. 

No fundo, o que eu quero é sentir-me segura nesta nova fase. Quero adquirir a experiência que me faz sentir tranquila e plena, embora, para tal, necessite de percorrer o caminho desconhecido vezes e vezes sem conta até este se tornar familiar. Quero ser grande sem precisar de crescer. Faz algum sentido? Ser sábia sem ter de passar pelas adversidades e lições da vida? 

Sei que esta ânsia é a minha necessidade de controlo a falar. É a minha necessidade de ser bem sucedida, não aos olhos dos outros, mas aos meus. Porque os meus olhos são os mais exigentes de todos. Eu sou a única que não me permito falhar, que não aceito a incerteza, que não normalizo o que é natural. Tenho tanto medo de fracassar, de fazer e dizer a coisa errada, de descobrir que sou uma farsa, uma impostora. No fundo, é como se todo o meu valor dependesse do que sou capaz de alcançar. 

Preciso de abraçar a incerteza com curiosidade; de me permitir errar; de desfrutar mais do processo e desligar-me do resultado final; de viver mais no agora do que nos meus medos imaginários, que apenas pertencem a um futuro longínquo e, muito provavelmente, nunca tornado realidade. 

Estou a crescer e a ser desafiada. Já me tinha esquecido de como é assustador e entusiasmante ao mesmo tempo. Preciso de respirar fundo e aceitar que este processo é mesmo assim. Que estes momentos de incerteza e vontade de desistir fazem parte. É a necessidade de conforto e controlo a gritar, são as resistências a fazer força e pressão. Respiro fundo e sei que, apesar de tudo, nunca conseguirei desistir. Pelo menos não agora. Porque se o fizesse não seria pelos motivos corretos. Não seria por perceber que afinal não é isto que me preenche e não é isto que quero para mim. Seria apenas pelo medo. 

Quando aceitei este desafio, foi com as palavras do meu amor em mente e com o bichinho de felicidade que se instalou no meu coração. Ele disse-me "aceita, nem que seja para perceberes se gostas!". E quando ele me disse estas palavras, tudo fez sentido e percebi que queria muito isto. Queria muito tentar. Mesmo que, para isso, me sinta tão perdida e desorientada tantas vezes. Mas se há característica que faz parte de mim é a persistência. Para ser grande, sê inteiro! Põe quanto és, no mínimo que fazes! Este é o meu lema, é a minha forma de estar na vida e é o modo com que encaro todos os desafios que me são lançados. Talvez seja até desta dedicação que nascem as ramificações do meu medo de fracassar, pois dou tudo de mim, pelo que é inevitável surgir o pensamento "e se, mesmo assim, não for suficiente?". O meu medo é proporcional à quantidade de esforço, energia e dedicação que emprego. Quanto maior é o meu medo, maior é a minha vontade de o ultrapassar. Mas quanto maior é o meu esforço e entrega, maior é a possibilidade de o fracasso ser recebido com angústia e dor. 

Independentemente de tudo, estou consciente de tudo o que estou a sentir e a pensar. Estou consciente de que este é um processo. E comecei este texto a falar de sinais. Comecei a escrever este texto ontem e hoje, quando regressei ao meu rascunho, sabem qual era a frase que me esperava?

Trust the process.

Acho que me resta confiar, certo? Em mim e em que tudo vai dar certo. Seja lá o que for esse certo!

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