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the old soul girl

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08
Ago23

Getaway Car

girl

Uma das minhas características, que tantas vezes me irrita e torra a paciência, é que tendo dois caminhos possíveis diante de mim, opto (quase) sempre pelo mais difícil. Não me questionem, há qualquer coisa que me atrai em ir atrás das dificuldades. Ou simplesmente na falta de inteligência! Lembro-me das aulas de matemática, no liceu, em que a minha melhor amiga olhava para mim, com espanto e surpresa (e também, provavelmente, pena pela minha alma complicada), por me ver a calcular, manualmente, a fórmula resolvente, quando tínhamos a mesma instalada na nossa calculadora XPTO e nos permitia obter o resultado em segundos. Pior, mais do que calcular manualmente, eu fazia este cálculo, muitas vezes, depois de já ter o resultado dado pela máquina, apenas para confirmar que estava correto. Quem fala desta situação, fala de muitas outras. Parece que algo me compele a ir sempre atrás do que dá mais trabalho, do que exige mais de mim. 

É por isto que, quando decidi optar por um carro de condução automática, me senti em falha comigo mesma. Pela primeira vez na minha vida, encontrei-me a optar pelo caminho mais simples e fácil. Pareceu-me batota, como se estivesse a atalhar por uma rua que me leva exatamente ao mesmo ponto de chegada, enquanto todos os outros estão a percorrer o caminho "oficial". 

Conduzir, para mim, sempre foi uma questão. Não por não gostar de o fazer, mas por me sentir a pessoa mais incompetente, mal preparada e incapaz do mundo quando o fazia. Nada na minha vida me fez sentir tão pequenina como a sensação de me sentar em frente ao volante, engatar a primeira e não conseguir arrancar. Convenci-me de que era uma nódoa, uma vergonha, uma impostora, que por mera sorte passou no exame de condução à primeira, enquanto tanta gente mais competente e capaz chumbou. E esta é a parte engraçada do funcionamento das nossas mentes: quando as alimentamos diária e regularmente com proteína negativa, elas tornam-se resistentes a outro tipo de nutrição. 

Sentia-me cansada de estar dependente de outros, de me sentir um peso e uma inútil sempre que as minhas ansiedades e cismas levavam a melhor de mim e me obrigavam a pedir a alguém que me desse boleia, que me fosse buscar, etc. Não vivo numa cidade especialmente grande nem com uma vasta oferta de transportes públicos, pelo que, as únicas opções possíveis eram a) andar a pé ou b) andar à boleia. O grande problema é que a primeira opção nunca foi viável para me deslocar para o trabalho.

Assim, durante muito tempo, esta condicionante fez-me sentir mal comigo mesma. Ponderei regressar à escola de condução para ter algumas aulas, mas os meus pais sempre me disseram que o meu problema não estava na minha competência a conduzir, mas sim na minha confiança acerca da minha competência. Eles diziam que precisava de praticar, de arriscar, de me expor à vulnerabilidade de ser uma amadora e permitir que a experiência fizesse o seu papel e me fizesse adquirir gradualmente confiança em mim mesma. Perdi a conta ao nº de vezes que determinei, ano após ano, que me dedicaria à condução. "Este ano vai ser o ano em que vou conduzir!" dizia a mim mesma, todas as passagens de ano, à meia noite. Escusado será dizer que à primeira falha, adversidade ou contratempo, regressava ao meu estado de incapacidade. 

Até que me surgiu a ideia de conduzir um carro automático. A minha maior dificuldade foi sempre lidar com a ansiedade que advém quando o carro vai abaixo na entrada de uma rotunda, após o semáforo passar de vermelho a verde e, especialmente, nas subidas. Mais do que fazer o ponto de embraiagem, preocupava-me não ser capaz de tornar a conseguir conduzir se o carro fosse abaixo. Mas este medo e fonte de ansiedade poderiam facilmente dissipar-se se conduzisse um carro automático, que não exige muito mais do que travar e acelerar. Pareceu-me uma solução boa, boa demais, que pairou na minha mente durante alguns meses, até que decidi avançar com a compra. 

Sentia-me uma batoteira, mas pior do que me sentir uma desistente, era a sensação de me sentir uma dependente e um fardo para os outros. Por isso, quando comprei o meu carro, o meu primeiro carro de sempre, fi-lo para adquirir a minha liberdade, a minha independência, mas sentindo-me, simultaneamente, a optar pelo caminho mais fácil e simples, algo que nunca fiz. 

Admito, passado quase um ano, que foi a melhor decisão que poderia ter tomado. Os ganhos, as vantagens que me trouxeram a condução automática ultrapassam, largamente, a minha necessidade de complicar e insistir no difícil. Perdi a vergonha de admitir que conduzir era um problema dantesco para mim, que estava cravado no meu sentido de identidade, fazendo-me sentir um fracasso. Conduzir, hoje, é prazeroso. Ainda me surpreendo, de quando a quando, com a capacidade que adquiri de ir sozinha onde me apetece, onde preciso de ir. Uma parte de mim estava profundamente convicta que nunca seria capaz de o fazer. É incrível fazê-lo e compreender que o caminho mais fácil revelou-se o melhor para mim. Não me coloca em cheque, não me minimiza. Como diz uma grande amiga minha: automático ou manual, não deixa de ser conduzir e tu estás a fazê-lo! 

18
Ago20

As melhores férias

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A Ana, que já se apercebeu que eu gosto de desafios, lançou-me o de vos falar das melhores férias num máximo de 100 palavras. Ana, o desafio não será partilhar as melhores férias, mas sim ser capaz de o fazer recorrendo só a 100 palavras. Mas, challenge accepted, bring it on!

Quando te perdes é quando a verdadeira aventura começa” diz-me um estranho simpático, atento à minha falta de orientação. Barcelona é cor, luz, juventude, arte e liberdade. As longas caminhadas, ora subindo, ora descendo. As dores de pescoço de tanto olhar para cima e vislumbrar arte a cada passada e cada esquina. A explosão de sabores do Boquería e do Pura Brasa. A liberdade daqueles passeios de bicicleta, com o cabelo ao vento e o sorriso estampado na cara. A felicidade no estado mais puro dos espetáculos da Fonte Mágica. A dor na partida, com a promessa de um regresso.

29
Jul20

surrender

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No dia em que me ligaram a confirmar a minha disponibilidade para o novo desafio que me tinha sido proposto, eu tinha acabado de fazer uma meditação guiada da Sarah Blondin, chamada Learning to Surrender.

Antes de avançar, quero apenas dizer-vos que a Sarah é, provavelmente, das melhores "professoras" de meditação que poderão encontrar. Todas as meditações dela são mágicas, a Sarah tem uma presença que emana tranquilidade e paz. Por isso, fica aqui o meu conselho para a irem pesquisar no Insight Timer, estou certa de que não se arrependerão. 

Retomando. Learning to Surrender. Surrender pode ser traduzido como rendição, entrega. Para mim, como tenho vindo a escrever, a capacidade de entrega, de deixar fluir, é uma aprendizagem contínua, porque toca na minha maior necessidade, que é a de controlo. Controlo e entrega não são compatíveis. Do mesmo modo que controlo e vida também não o são. Na verdade, há pouquíssimas, raras coisas que podemos controlar nesta nossa existência. Podemos controlar os nossos pensamentos (ou, pelo menos, a influência que estes têm sobre nós), os nossos comportamentos e emoções. Podemos controlar a forma como reagimos ao que nos acontece, mas nunca seremos capaz de controlar o que nos acontece. As alegrias e infelicidades da vida não são, muitas vezes, selecionadas por nós. Apenas nos resta ser capazes de lidar com elas da melhor forma possível, do modo que temos disponível naquele momento para enfrentar aquela situação. 

Hoje é o segundo aniversário da morte da minha família como sempre a conheci. Da família onde cresci, onde fui e fomos imensamente felizes. Não escolhi este desfecho, simplesmente aconteceu. Veio bater-me à porta, com uma força e urgência de quem não pede permissão para entrar. Gosto de pensar que tudo o que nos acontece tem o poder de nos transformar. Que tudo pode ser um presente. Mesmo que não venha embrulhado num papel colorido e seja apetecível. Na verdade, há oportunidades únicas de mudança que nunca olharemos como positivas, mas saberemos sempre que foram necessárias para o nosso crescimento. Esta é uma delas. Dificilmente olharei para este acontecimento como positivo, mas consigo extrair dele valiosas aprendizagens. Uma delas é precisamente sobre ser capaz de me render à vida. Aceitar tudo - o bom e o mau - resistindo cada vez menos à mudança. 

Quando me telefonaram, tinha acabado de ouvir a Sarah a dizer que entrega não é o mesmo que desistência. Não é algo passivo. Entrega é sermos capazes de fluir com a vida, de a seguirmos como a água segue o curso natural do rio, que segue o seu caminho ao oceano, fundindo-se num só. É sobre desconstruir resistências, porque tudo aquilo ao qual resistimos, apenas persistirá, como Jung nos ensinou. É sobre compreender, com a mente e o coração, de que o controlo é uma ilusão, de que quando deixamos de ter essa necessidade, podemos estar abertos, curiosos e disponíveis para todas as oportunidades que a vida tem para nós. A meditação acabou, eu ainda estava enfeitiçada por estas palavras mágicas, quando o telefone tocou e me fizeram a proposta oficial. Eu sei que ultimamente tenho falado muito acerca de sinais, mas naquele momento, não fui capaz de ignorar a mensagem. Quando nos propomos a abraçar a vida, com tudo que esta tem para nos oferecer, as coisas simplesmente acontecem. No meu caso, tive esta prenda, mas não me enganei, este é um presente que traz consigo uma dose enorme de desafio e crescimento, como vos tenho contado. Deixou-me muito feliz, mas rapidamente percebi que ia estremecer com todas as minhas inseguranças e defesas. A vida não tira sem nos dar nada em retorno, do mesmo modo que não nos dá, sem nos tirar algo também. É um fluxo contínuo, que não podemos contrariar. 

Por isso, escolho olhar para o dia de hoje como uma oportunidade de recomeço. De renovar pensamentos, de me desfazer de crenças e medos que não me acrescentam, apenas consomem. Somos responsáveis pela nossa vida e, como tal, pela nossa felicidade. Que nos esqueçamos de que somos detentores desse poder e, como tal, dessa responsabilidade. 

28
Jul20

trust

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Os sinais existem e estão presentes, basta estarmos atentos e, talvez o mais importante, estarmos recetivos. Hoje entro no meu computador de trabalho, iniciando sessão e abrindo o google chrome, que me recebe sempre com uma frase inspiradora para começar o dia em pleno. A frase que me abraçou hoje foi a seguinte:

Unless you try to do something beyond what you have already mastered you will never grow. - Ralph Waldo Emerson 

Esta citação resume na perfeição a fase que estou a viver. Estou perante um processo de aprendizagem enorme, que me está a desafiar a todos os níveis. Está a mexer com todos os meus medos e receios, com todas as minhas forças e fragilidades. Tenho momentos de confiança e, a seguir, começo a sentir o medo a espreitar, a aproximar-se e a sussurar-me ao ouvido "será que és mesmo capaz?". Sinto o entusiasmo, a adrenalina de me dedicar a algo que me enche tanto o coração e me faz sentir tão viva, mas, ao mesmo tempo, os velhos receios e os pensamentos negativos explodem diante de mim. Quero focar-me apenas no lado positivo, mas não existe luz sem sombra; esta experiência é um todo e, como tal, é também constituída por momentos de angústia no meio de tantos momentos de alegria e euforia. 

Olho para dentro de mim e vejo dois caminhos. Vejo o velho e conhecido caminho, aquele que me faz sentir segura, mas frustrada; que é reto, plano e não requer grande energia da minha parte para ser percorrido (porque, de tão velho que é, conheço-lhe cada milímetro e percorro-o de olhos fechados). E depois vejo um outro, que não está sequer finalizado, que brilha com muita intensidade, com tanta luz, que me ofusca e faz sentir tonta e desnorteada. É tentador, mas deixa-me apreensiva, o meu estômago enrola-se em si mesmo e sinto a minha garganta contorcer-se num nó cego. Por um lado, quero sentir-me segura e estável; por outro, quero a aventura, o desafio. Quero ambos os caminhos, quero se cruzem e formem um só. 

No fundo, o que eu quero é sentir-me segura nesta nova fase. Quero adquirir a experiência que me faz sentir tranquila e plena, embora, para tal, necessite de percorrer o caminho desconhecido vezes e vezes sem conta até este se tornar familiar. Quero ser grande sem precisar de crescer. Faz algum sentido? Ser sábia sem ter de passar pelas adversidades e lições da vida? 

Sei que esta ânsia é a minha necessidade de controlo a falar. É a minha necessidade de ser bem sucedida, não aos olhos dos outros, mas aos meus. Porque os meus olhos são os mais exigentes de todos. Eu sou a única que não me permito falhar, que não aceito a incerteza, que não normalizo o que é natural. Tenho tanto medo de fracassar, de fazer e dizer a coisa errada, de descobrir que sou uma farsa, uma impostora. No fundo, é como se todo o meu valor dependesse do que sou capaz de alcançar. 

Preciso de abraçar a incerteza com curiosidade; de me permitir errar; de desfrutar mais do processo e desligar-me do resultado final; de viver mais no agora do que nos meus medos imaginários, que apenas pertencem a um futuro longínquo e, muito provavelmente, nunca tornado realidade. 

Estou a crescer e a ser desafiada. Já me tinha esquecido de como é assustador e entusiasmante ao mesmo tempo. Preciso de respirar fundo e aceitar que este processo é mesmo assim. Que estes momentos de incerteza e vontade de desistir fazem parte. É a necessidade de conforto e controlo a gritar, são as resistências a fazer força e pressão. Respiro fundo e sei que, apesar de tudo, nunca conseguirei desistir. Pelo menos não agora. Porque se o fizesse não seria pelos motivos corretos. Não seria por perceber que afinal não é isto que me preenche e não é isto que quero para mim. Seria apenas pelo medo. 

Quando aceitei este desafio, foi com as palavras do meu amor em mente e com o bichinho de felicidade que se instalou no meu coração. Ele disse-me "aceita, nem que seja para perceberes se gostas!". E quando ele me disse estas palavras, tudo fez sentido e percebi que queria muito isto. Queria muito tentar. Mesmo que, para isso, me sinta tão perdida e desorientada tantas vezes. Mas se há característica que faz parte de mim é a persistência. Para ser grande, sê inteiro! Põe quanto és, no mínimo que fazes! Este é o meu lema, é a minha forma de estar na vida e é o modo com que encaro todos os desafios que me são lançados. Talvez seja até desta dedicação que nascem as ramificações do meu medo de fracassar, pois dou tudo de mim, pelo que é inevitável surgir o pensamento "e se, mesmo assim, não for suficiente?". O meu medo é proporcional à quantidade de esforço, energia e dedicação que emprego. Quanto maior é o meu medo, maior é a minha vontade de o ultrapassar. Mas quanto maior é o meu esforço e entrega, maior é a possibilidade de o fracasso ser recebido com angústia e dor. 

Independentemente de tudo, estou consciente de tudo o que estou a sentir e a pensar. Estou consciente de que este é um processo. E comecei este texto a falar de sinais. Comecei a escrever este texto ontem e hoje, quando regressei ao meu rascunho, sabem qual era a frase que me esperava?

Trust the process.

Acho que me resta confiar, certo? Em mim e em que tudo vai dar certo. Seja lá o que for esse certo!

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