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the old soul girl

the old soul girl

27
Abr20

emotional

girl

Há quase um mês que não escrevo e poderia dizer que é por falta de tempo, mas nem eu acredito nisso. A verdade é que escrever não tem sido uma das minhas prioridades nos últimos tempos. Sinto que não existe nada sobre o qual me apeteça escrever ou que valha a pena fazê-lo. Pensei escrever sobre um documentário que vi e me deixou a pensar na forma caótica como vivemos (ou existimos). Pensei escrever sobre um livro que li recentemente e me fez chorar aos soluços de madrugada, como já não me lembrava. Pensei escrever sobre uma nova banda de música que descobri e cujas letras são autênticos poemas. Pensei escrever sobre o desafio que coloquei a mim mesma de ser mais ativa e de fazer exercício físico quase todos os dias da semana e sobre os resultados que já começo a obter. Pensei escrever sobre o difícil que é viver uma quarentena com uma família em que mãe e pai estão divorciados. Mas depois, quando me sentava em frente ao computador e olhava para o ecrã vazio à minha frente, não conseguia evitar pensar "para quê?". É como se tivesse este conjunto de pensamentos a bombar dentro da minha cabeça, mas optasse por os manter em cativeiro em vez de os libertar, porque a simples ideia de ter de lhes abrir a porta para sair me custava e me pesava.
E foi nesta fase de acalmia que me dei conta que não são apenas os pensamentos que mantenho reféns, mas também as emoções. E percebi que não o faço apenas com as negativas, mas também com as positivas. Dei por mim a não saber sentir-me feliz, a não ser capaz de identificar uma emoção tão agradável e positiva como a alegria. Foi uma epifania. Percebi que tenho tanta tensão acumulada dentro de mim, que deixei de conseguir distinguir a que é boa da que é malévola. Entendi que estou a bloquear todas as emoções e estou a fazê-lo como um mecanismo de sobrevivência para que tudo se mantenha neutro e em equilíbrio. Os últimos dois anos da minha vida foram tão agitados e intensos que me levaram a procurar um estado de inércia, de linha contínua, que confundo muitas vezes com paz e tranquilidade. Mas a vida não é assim, aliás, a vida não pode ser assim. Porque quando tentamos a todo o custo bloquear o mau, também acabamos por bloquear o bom. E sem mau como é que sabemos o que é bom? E haverá realmente algo totalmente mau e algo totalmente bom? Existencialismo ao rubro. 
Comecei a desenrolar este novelo complexo aos bocadinhos, a puxar sempre mais um pouco e percebi que esta minha ânsia de controlar toda e qualquer emoção que provoca um pico na linha regular do meu batimento cardíaco se expandiu como um vírus, chegando ao ponto de me levar a evitar falar sobre determinados assuntos, de deixar de ver determinado filme por ter receio de ser demasiado intenso e mexer demasiado com as minhas emoções. Conseguem entender a dimensão do que estava a fazer a mim mesma? De como estava a negar tudo aquilo que é a vida, que faz parte dela, para atingir o tão desejado equilíbrio?
Mas depois li o tal livro que mexeu com todas as minhas emoções e me virou do avesso. E depois ouvi as tais canções cujas letras são poesia e senti o ritmo do meu coração galopar. E depois vi o documentário que me mostrou o perigo de "engolir" as emoções sem as digerir, a forma como podemos adoecer em todos os planos físico, mental, social. E percebi que aquela pessoa que se emocionava, que estava a permitir-se sentir tudo com a intensidade devida era eu. Era o meu antigo eu. O eu de quem sinto saudades. Eu nunca temi nenhuma emoção, minha ou dos outros. Foi sempre esse estado de conforto e à vontade com toda e qualquer emoção que levou as pessoas a procurarem-me sempre que precisavam de falar, de desabafar. Nunca me esquecerei quando uma amiga me disse que o meu maior dom era a forma como fazia as pessoas sentirem-se confortáveis na minha presença, como se não existissem vergonhas e barreiras. Essa pessoa que eu sempre fui, de quem eu tinha tantas saudades, desapareceu quando comecei a querer controlar todas as emoções, quando comecei a racionalizar os sentimentos. Porque antes, quando me permitia sentir, era muito mais saudável e equilibrada do que sou hoje, que tento controlar tudo. É irónico.
Eu nunca tive medo de sentir até ter sentido uma dor tão forte, que me paralisou. Que fez o meu mundo estremecer e ficar sem sentido. Estou há dois anos a tentar processar o que trago cá dentro. No outro dia, numa meditação, viajei ao dia em que a minha vida mudou radicalmente. Voltei àquele domingo de julho, todos os detalhes daquele dia são tão vivos a minha memória e, ao mesmo tempo, tão vagos. Lembrei-me do que foi possível e senti as lágrimas escorrerem pela minha cara. Não foi um choro compulsivo, não desabou nenhuma barragem emocional dentro de mim. Foi um choro suave, livre, mas profundo. Aquelas lágrimas vieram de recônditos escondidos dentro de mim. Naquele momento, senti vontade de me abraçar. De me consolar e aconchegar. De me deixar ir, de libertar o peso do mundo que trago dentro de mim.
Estou neste estado de consciência, em que começo a ver as coisas com mais clareza, mais nitidez e de forma mais ampla. Não tenho escrito, porque dentro de mim sei que não me apetecia escrever sobre nada mundano e vago. Acho que sabia exatamente o que queria escrever, mas não acreditei que seria capaz de o fazer. Ainda acho que este texto não cumpre grande lógica, não tem qualquer fluidez e beleza como eu gosto de ler. Mas tem verdade, a minha. E acho que nesta fase, ser verdadeira comigo, é tudo aquilo que mais preciso.

03
Abr20

we are okay, we are alright

girl

Todas as crises, pequenas, médias e grandes, têm o poder de nos transformar, se estivermos recetivos à mudança. Podemos sempre aprender algo novo sobre nós, sobre os outros, sobre o mundo e a própria vida. Mas temos de estar disponíveis e abertos para olhar para as coisas, até então conhecidas, certas e previsíveis, com um novo par de olhos. Foi o que eu tentei fazer esta semana. Depois de ter vivido praticamente todo o mês de março em sobressalto, envolvida em emoções de angústia, revolta, raiva, injustiça, ânsia e receio, entendi que, pela minha saúde, estava na hora de parar. Como não posso parar no sentido lato da palavra e me ejetar do meu ambiente tóxico (que é o do trabalho), compreendi que tinha de mudar o meu comportamento e a minha atitude perante a situação em que me encontro. Estava farta de me sentir desgastada, de me sentir zangada por qualquer coisa, ainda que mínima, de me estar sempre a queixar das mesmas velhas coisas que, precisamente por serem velhas, significa que não serão elas a mudar, mas que tinha de ser eu a fazê-lo. Podemos sempre fazer uma escolha perante tudo o que nos acontece, é onde reside a nossa verdadeira e única liberdade, como Frankl nos ensinou há muito tempo e fruto de condições muitíssimo mais adversas do que aquelas em que nos encontramos.
Por isso, esta semana quis inverter tudo e comecei pela forma que me é mais familiar: procurar coisas positivas nesta situação. Porque existem. Existem sempre em tudo que nos acontece, basta procurar. E a primeira coisa que me ocorreu foi, ironicamente, o meu trabalho. O meu discurso parece esquizofrénico, eu sei, até eu própria fico confusa. Mas a verdade é que embora esteja perto do limite do estar farta de aqui estar, por outro lado, sei que trabalho num lugar que dificilmente será afetado por esta crise económica que se avizinha, que até ao momento triplicamos os nossos serviços e que não se precisou de tomar qualquer medida que envolva imposição de férias ou lay offs. Por isso, este trabalho, neste momento, assemelha-se muito a um bote salva-vidas no meio de um tempestade no oceano. E para tempestiva já me basta a minha vida familiar, por isso, arrisco-me a dizer que é uma bênção enorme ter este emprego.
Também pode parecer estranho a próxima coisa positiva que vou referir, porque, novamente, parece contraditória. Dava tudo para estar protegida e segura em casa, através de teletrabalho. Todos os dias tenho uns minutos de introspeção de pânico em que penso se já estarei infetada e faço um check-up interno para verificar a possível existência de sintomas. Mas depois olho para a minha família em casa, que está protegida fisicamente, mas que emocionalmente começa a ficar erodida. Os dias parecem-lhes todos iguais, não conseguem acompanhar-me nas celebrações por ser sexta-feira, não tem novidades para contar. Começam a ficar sem ideias para ocupar o tempo, estão saturados uns dos outros (mais do que o normal). E eu penso para mim que, embora seja um ato sádico sair de casa e expor-me, pelo menos, enquanto estou a trabalhar, a minha mente está ocupada com outras coisas que não a situação atual. Estou distraída, às vezes parece que nada mudou para mim, porque no trabalho tudo continua como se nada fosse e a minha rotina não se alterou significativamente. Posso sair de manhã com segurança de que tenho um motivo para estar fora de casa. Não estou tão cansada psicologicamente, ainda consigo incutir alguma esperança e leveza lá em casa, o que é mais do que positivo. É ótimo!
Penso que esta situação tem o poder de unir as pessoas, de nos fazer refletir que sempre estivemos todos no mesmo barco e que ganhamos muito mais se remarmos todos na mesma direção.
E, num microcosmos individual, sinto que esta situação me tem dado a descobrir novas perspetivas sobre mim mesma. Esta semana senti-me leve pela primeira vez em muito tempo. Acho que ajudou tanto ter tido um quase colapso emocional na semana passada, porque me permitiu aliviar muita carga pesada que já carregava há muito tempo. Externalizar, coisa que é tão rara em mim, libertou-me e deu-me espaço para compreender as coisas de outro ângulo. Trouxe-me um ritmo mais calmo, brando e uma capacidade de reflexão maior, que estava refém de uma impulsividade nada amigável. Dou comigo a pensar que tudo vai ficar bem, a cantar mentalmente Andrà tutto benne ao longo do dia, a sentir-me em paz comigo mesma, porque sei que todos os recursos mentais e emocionais devem ser poupados para esta longa caminhada que temos diante de nós. Temos de poupar energias, poupar-nos ao máximo, para sermos capazes de aguentar até o cruzar da meta. Para isso, é preciso flexibilizar, olhar mais para o que temos do que para o que nos falta, acreditar que é uma situação temporária e, acima de tudo, externalizar o que vai dentro de cada um de nós. Não podemos fingir uma tranquilidade que não temos, se é medo que sentimos. Temos de dar espaço a todas as emoções que surgirem, mas não esquecendo que somos nós que tomamos a decisão de quais iremos alimentar.
Esta semana escolhi privilegiar a minha paz interior, abrindo mão de tudo aquilo que não é justo, mas que também não está ao meu alcance mudar. Aceitei que as coisas são como são, que nunca haverá justiça no mundo e que eu apenas posso ser justa comigo mesma e nas ações que pratico, para comigo e para com os outros. Quando compreendi que a minha energia deveria ser canalizada para coisas que poderiam realmente mudar e fazer sentido, alcancei a tranquilidade que não tinha até então. Não estou no estado nirvana e certamente que virão dias em que a minha serenidade será apenas uma memória, mas hoje estou bem e em paz. E esta situação, se serviu para enfatizar algo, foi que só temos o momento presente como certo. Por isso, hoje estou bem, a saborear a ideia de que é sexta-feira e espero que, se alguém ler este texto, pare para pensar em tudo aquilo de bom que tem neste momento e sorria. Porque há sempre um motivo para sorrir. Nem que seja a beleza de um sorriso em si mesmo. 

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