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the old soul girl

the old soul girl

14
Out19

dream big or go home

girl

Iniciei a minha vida profissional há um ano e meio, quase dois. Saída da faculdade, fresquinha, tive uma oportunidade quase imediata à defesa da tese de mestrado e ingressei num estágio profissional. Este estágio deu origem a mais uma oportunidade, à de ficar na empresa, que aceitei sem reservas. Afinal, para quem está a começar, as exigências não podem ser muitas e além de ser na minha cidade natal, o salário oferecido era/é bom. 

Quando penso nos tempos de estudante, 17 anos depois, sinto que foram os melhores anos da minha vida. Nunca me senti cansada de ser estudante. Nunca tive pressa em entrar no mercado de trabalho e nunca ansiei pelo fim da vida académica. Sempre gostei de estudar, porque estudar sempre foi sinónimo de aprendizagem. Mesmo nas disciplinas e cadeiras mais chatas, sinto que aprendi sempre alguma coisa. Nunca foi um desperdício de tempo. E na faculdade o meu gosto por aprender intensificou-se, porque estava na minha praia. Gostei verdadeiramente do meu curso e, para quem escolheu às cegas, sempre senti que tinha sido um golpe de sorte. As expectativas nunca foram muito elevadas, por isso, quando cheguei à faculdade foi tudo uma agradável surpresa. Tudo era novo, mesmo na minha mente, que não tinha criado qualquer imagem ou projeção. E como gostava tanto do que estudava, ir às aulas nunca era um sacrifício (não faltava nunca, nem mesmo às mais chatinhas) e isso refletia-se nos resultados obtidos. 

Foi na faculdade que aprendi que quando fazemos as coisas por gosto, cansamo-nos na mesma, mas a satisfação é mais forte do que qualquer cansaço. O gozo e o desafio permitem aguentar qualquer tormenta, porque sabemos que chegaremos sempre a bom porto. Por isso, quando cheguei ao mercado de trabalho, vinha preparada para me cansar, mas também para me sentir satisfeita, realizada. 

Devido à escassez de oportunidades na minha área de especialização, fui obrigada a seguir um plano alternativo. Ainda dentro da minha área de estudo, mas mais distante daquilo que realmente me enchia a alma. Não fiquei triste nem preocupada, afinal só queria uma oportunidade e sabia que podia sempre resgatar o meu sonho mais tarde. Não entrei a pés juntos, entrei com o pé direito: não era o que tinha sonhado, mas seria bom na mesma. E foi e é. Não posso dizer que não gosto do que faço, porque estaria a mentir. Gosto de quase tudo o que faço. Somente não gosto de como e onde o faço. E, com isso, não consigo sentir-me satisfeita nem realizada.

Hoje, à hora de almoço, eu e os meus colegas falávamos sobre segundas-feiras. Como são difíceis, como o domingo à tarde já é vivido com angústia e algumas pontadas de depressão. Questionei-os "será que as pessoas que adoram o que fazem também se sentem assim às segundas-feiras?". Esta é uma questão que me coloco muitas vezes. Porque sei que não existem trabalhos perfeitos, não há bela sem senão, mas também sei que nada na vida é perfeito e, muitas vezes, o que mais gostamos nas coisas, nas pessoas e nos momentos são as suas imperfeições, que as tornam únicas. Então, porque é que não conseguimos gostar do que fazemos mesmo com as suas imperfeições? 

Para algumas pessoas este é um não assunto. O meu namorado, por exemplo, não procura realização pessoal no trabalho; fica feliz se o salário for chorudo. A sua insatisfação só advém da sensação de que recebe pouco para o trabalho que faz. Mas para mim, que sempre valorizei tanto a satisfação e consegui obtê-la em quase tudo em que coloquei a minha dedicação, o salário não é tudo. Ao fim de quase dois anos, que considero ser significativamente nada em termos de tempo, sinto-me esgotada e quase nada satisfeita. Talvez realizada por ter aprendido coisas novas, por ter compreendido como funciona o mundo do trabalho, por ter conhecido pessoas novas, mas tudo isso, ao fim de pouco tempo, é história. As coisas novas transformam-se em aprendizagens consolidadas, a forma como funciona o mundo profissional é decrépita e confrontamo-nos diariamente com injustiças e as pessoas novas nem sempre são agradáveis surpresas. 

Assim, questiono novamente: será que as pessoas que adoram o que fazem sentem que têm de trabalhar algum dia das suas vidas? O período em que estava a escrever a minha tese de mestrado, foi um período muito conturbado. Adorava o meu tema, a minha investigação, mas tinha uma desorientadora de tese: uma professora que era capaz de dizer que o sul era para o lado norte. Uma pessoa extremamente desorganizada, que lia as coisas na véspera, que fazia uma pessoa sentir-se vulnerável, perdida e muito pouco confiante acerca do seu trabalho. Naquela época, eu olhava para essa etapa - a de escrever e defender a tese - como a mais difícil e exigente da minha vida até então. Era o grande desafio e todos os dias me questionava se seria capaz de fazer um bom trabalho, que espelhasse as minhas competências, que falasse por mim. Mas mesmo nesse mar de ansiedade, de medos e receios, de noites mal dormidas, eu consiga sentir-me realizada. Acreditem: era um autêntico pesadelo trabalhar naqueles moldes, mas quando me dedicava só a escrever e a criar, sentia-me no meu pequeno paraíso. E extremamente realizada. 

O meu trabalho atual, sinto que o faço bem. Considero-me competente, mas sei que não vou evoluir muito mais do que evolui até à data. Não porque já tenha aprendido tudo (essa coisa de aprender tudo simplesmente não existe ), mas porque não há possibilidade de crescimento aqui dentro. E não falo em termos hierárquicos, de chegar a uma posição de chefia. Falo a nível de realização. Não há estímulo, não há criatividade, não há desafio. O único desafio é manter a sanidade mental, compreendem? A nível de trabalho, não há espaço, não há autonomia para tentar. Primeiro, porque podemos ser altamente punidos se tentarmos e correr mal; depois, porque se somos punidos por tentar, como é que podemos estar dispostos a tentar futuras vezes? Deixamo-nos estar, no nosso canto, com as nossas tarefas básicas, seguras e sem qualquer pontinha de satisfação. 

Não me interpretem mal: sei que não existem trabalhos perfeitos. E, por vezes, é tudo uma questão de matching: a pessoa certa para a empresa certa. Eu sei que estou na errada, mas a fórmula que pode não funcionar comigo, pode ser a chave de ouro para outra pessoa. Sei que nem tudo na vida são rosas e aceito-o: afinal, mantenho-me neste emprego porque, nesta fase da vida em que me encontro, são mais as razões que me prendem do que as que me libertam. Mas, ainda assim, não consigo deixar de pensar que a cada dia que aqui me mantenho, é menos um dia de satisfação, de realização, de sensação de estar no sítio certo. 

Escrever permite-me organizar as gavetas de ideias da minha cabeça. Às vezes só sinto que não estou bem aqui, mas quando escrevo consigo saber os motivos do porquê: porque me falta satisfação. Falta-me prazer. Falta-me adrenalina daquela boa, que nos estimula. Falta-me desafio. Talvez seja demasiado freudiana por pensar que amor e trabalho são as duas grandes esferas da vida do ser humano, mas é a minha verdade. No meu caso, não se trata de ser o trabalho perfeito: trata-se de ser um trabalho imperfeito, cujas imperfeições eu seja não só capaz de aceitar, mas também de gostar. Aí sim, sentirei que as segundas-feiras não são difíceis. 

 

14
Out19

Ler nos detalhes

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Amor é ele dizer que gosta de olhar para mim enquanto leio. Que a minha expressão é idêntica a de alguém que está prestes a devorar alguma coisa.


Amor é atenção aos detalhes e, com estes, conhecer e compreender o outro como mais ninguém.

13
Out19

Let it be

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Às vezes tudo o que precisamos é apenas que nos abram espaço para sermos nós mesmos. Que nos permitam ser. Sem máscaras, artefactos, fingimentos. Muitas vezes só queremos ser compreendidos. Não precisamos que nos indiquem o caminho, apenas que nos assegurem que estão lá, do outro lado da estrada, a dar assistência. Ou que nos sussurrem "eu sei que é difícil". Porque passamos grande parte do tempo em combate. A tentar marcar o nosso ponto de vista, a defendermo-nos de possíveis atentados que ponham em causa o que somos. Por isso, quando alguém nos permite ser e nos recebe com empatia, praticamente não precisamos de mais. Mas para isso é preciso saber escutar para além de ouvir, ver para além de olhar. É preciso estar presente e, ao mesmo tempo, ter a capacidade de transporte: a de nos deslocarmos de nós e irmos ao encontro do mundo do outro. 

Quase todos os dias me ensinam isto. Que é neste jogo de aceitação, de permissão do outro, que realmente podemos fazer a diferença na vida de alguém. Porque esta diferença não tem de ser uma reviravolta de 180 graus. Às vezes é apenas um sorriso. Outras um abraço. Mas é sempre uma forma de comunicar: compreendo-te. 

 

12
Out19

books of 2019 #2

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Olá, olá, olá! Antes de mais, bom fim de semana a todos, espero que aproveitem ao máximo estes dois dias de descanso que não passam, voam! 

Volto para dar continuidade à lista de livros lidos este ano. Esta lista está em permanente atualização, porque nunca paro de ler e novos livros são adicionados constantemente. No entanto, vamos indo e vamos vendo (ou, neste caso, lendo!).

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11 e 12 - A morte do Comendador Vol. 1 e Vol.2 - Haruki Murakami - acho que Haruki Murakami merecia uma secção única, dedicada só a si. É dos meus escritores preferidos de sempre e sinto que não existem palavras suficientes para falar do quão incrível e talentoso este homem é. Já li vários livros da sua autoria e, se quiserem, posso dedicar-me, num outro post, a fazer uma espécie de top 5, na minha mais modesta e humilde opinião, está claro! Mas pronto, prosseguindo: A Morte do Comendador é uma obra que, para os leitores habituais de Haruki Murakami, não desilude, não desfaz expectativas. É uma obra de encontro, na medida em que voltamos sempre a reconhecer e reencontrar as características que o tornam num escritor tão singular: a solidão, a introspeção, o mundo fantástico que se cruza com o real como se fossem complementares, ambos lados da mesma moeda. Há tanta profundidade e simplicidade nesta obra, somos levados numa viagem tão alucinante que, a dada altura, já não sabemos sobre quem estamos a ler: se é sobre a personagem ou sobre fragmentos de nós mesmos. Vale mesmo muito a pena ler esta obra, dividida em dois volumes. Quando acabei o primeiro, o segundo ainda não tinha saído, pelo que um vazio instalou-se automaticamente: queria e precisava de saber mais sobre aquela história! Haruki Murakami é sempre uma aposta ganha e segura, acreditem.

13. Norwegian Wood - Haruki Murakami - não querendo entrar em repitação de tudo o que já escrevi anteriormente, mas, ao mesmo tempo, não podendo deixar de frisar novamente: leiam Haruki Murakami! Esta obra é uma boa opção para conhecer o autor e a sua escrita, pois lê-se mesmo muito bem, é uma história cativante e cheia de surpresas. Um romance contemporâneo que nos prende num segundo e só peca por terminar. 

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14. O Tatuador de Auschwitz - Heather Morris - este livro só é desconhecido para os habitantes de Marte. Está há imenso tempo no top de vendas e não é à toa: é incrível! Primeiro, tratando-se uma história verídica, o envolvimento com o livro é imediato. Sentimos logo, desde a primeira página, uma ligação com aquelas pessoas que não são personagens, são reais. Tudo que passaram não é, infelizmente, ficção. Depois, apegamo-nos a essas mesmas pessoas porque, embora tenham passado por tanto (tanta dor, tanta fome, tanto frio, tanto medo), nunca desistiram de lutar pela sua vida e pela dos outros. Os seus atos de generosidade, de amizade e amor podiam, tantas e tantas vezes, ser o caminho direto e rápido para a morte e, mesmo assim, estas pessoas nunca deixaram de agir por amor e nunca por medo. Acho que por mau, por muito horrível que todos saibamos que foi Auschwitz, nunca nos deixamos de impressionar pelos relatos do que por lá aconteceu e pelo que fizeram a tanta gente inocente. É sempre medonho, a barriga nunca deixa de se contorcer e um nó nunca deixa de se formar na garganta. Com este livro todas essas sensações são despoletadas; no entanto, também surge a esperança, a alegria, a força, a resiliência e a gratidão. Por isso, leiam esta obra prima, porque mais do que um excelente livro, trata-se de uma inspiração para a forma como cada um de nós vive esta tão magnífica dádiva que é a vida.

15. A Educação de Eleanor - Gail Honeyman - ora aqui está um livro que me fez agradecer o facto de ser persistente. Digo isto porque, tenho a confessar que no início não estava a gostar nada deste livro. Só pensava como a personagem principal, Eleanor, era estranha e como nada me fazia muito sentido. Mas a persistência (ou teimosia) falou mais alto e lá continuei. E ainda bem que o fiz, porque a dado momento a Eleanor, inicialmente estranha, começa a ocupar um lugar no nosso coração, dando cada vez mais sentido à expressão "primeiro estranha-se, depois entranha-se!", e começamos a compreender cada vez melhor o seu universo. Depois, à medida que vamos lendo e descobrindo mais, vão surgindo dois tipos de reação, díspares mas complementares: ora nos rimos que nem uns perdidos com as saídas da Eleanor, ora choramos com a sua fragilidade e história. Aconselho mesmo muito esta leitura, é uma verdadeira surpresa e garanto que não vos vai desiludir. 

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16. Eu e Eles - Kristan Higgins - uma curiosidade acerca da minha pessoa: quando leio um livro de um autor até então desconhecido e gosto muito, o meu primeiro instinto é ir imediatamente ver que outros livros existem da sua autoria. Foi o que me aconteceu com a escritora Kristan Higgins. Comecei por ler o "Bom demais para ser verdade" (ler em seguida para mais detalhes) e, como adorei, soube logo que queria ler mais desta autora. Assim, quando tive oportunidade lancei-me ao "Eu e Eles" e não fiquei nem um bocadinho desiludida. Sabem o que mais gosto nesta autora? A forma como nos dá a conhecer as personagens. É de uma mestria tão grande que, a dado momento, se torna muito difícil não pensar nas personagens como nossas amigas. Por isso é que sofremos com elas, sorrimos com as suas vitórias e deliramos quando todas as peças se encaixam. Esta obra é sobre o primeiro amor e como este pode durar uma eternidade. É sobre amar tanto, que apenas se quer o melhor para a pessoa amada, ao ponto de se pensar que essa pessoa merece tão mais e tão melhor que nós. É bonito e divertido, leiam!

17. Bom demais para ser verdade - Kristan Higgins - este romance também é tão delicioso! Novamente, personagens bem construídas, sólidas e divertidas, a par com uma história que, embora algo prevísivel, não deixa de ser maravilhosa. Aquele apontamento no final é tão querido, que só dá vontade de entrar dentro do livro e ser uma personagem da história. 

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18. Reencontro com o Amor - Melissa Pimentel - pronto, novamente a lengalenga que referi acima: descubro uma escritora nova, adoro o livro e vou à caça de todos os outros que já lançou. Este foi o primeiro livro que li da escritora Melissa Pimentel (que, inclusive, pensei ser portuguesa, mas não é). Estava de férias, foi uma ótima leitura light para descontrair e um bom romance. Achei que o início não foi muito promissor, mas à medida que fui conhecendo melhor as personagens, sobretudo as principais, comecei a gostar muito. O livro alterna entre o momento atual e o passado, o que é uma forma muito gira de descobrir a história e a evolução das personagens. No entanto, senti que o final foi muito ... como dizer ... atabalhoado? Um final que se esperava e que, por isso mesmo, deveria ter sido melhor construído. Em vez disso, acaba tudo muito rápido, sabendo a muito pouco. 

19. Procura-se homem (sem compromisso) - Melissa Pimentel - este está acabadinho de ler, terminei ontem à noite. E foi uma desilusão. Não sei se a autora tentou escrever a sua própria experiência através da lente de uma personagem, mas senti que a história está cheia de buracos. Temos uma personagem principal que, mal conhecemos, e já se está a lançar na experiência que suporta todo o livro: a de seguir livros guias de encontros para conhecer homens com quem passar um bom bocado. Entendemos que a personagem tem um passado, um passado importante para percebermos o seu momento atual, mas que nunca é aprofundado. Não sei explicar-vos, mas senti que foi um livro demasiado superficial e no qual não há desenvolvimento das personagens, o que faz com que não se consiga criar uma grande ligação com elas e com a história. É certo que tem momentos engraçados e, lá para o fim, começamos a sentir que conhecemos a Lauren (personagem principal) e que ela tem muito mais conteúdo do que aparenta, que tem uma personalidade forte e destemida, mas ainda assim ... Fiquei desiludida. 

E por hoje, no que diz respeito a livros, ficamos por aqui! Não sem antes agradecer à equipa do Sapo Blogs pelo destaque, que me encheu o coração de felicidade. Sobretudo por o destaque ter sido num texto escrito em jeito de desabafo, quase que vomitado (desculpem a imagem, mas entendam no sentido metafórico). Obrigada :)

 

10
Out19

A coisa mais maravilhosa

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Ele é terra, rochedo, fortaleza. É noite, mistério, silêncio. É de atos e não de palavras, o que explica o facto de saber sempre o que fazer e nunca saber o que  dizer. É confiança, às vezes aparenta arrogância, mas é mais simples e humilde do que imaginam. É correto, tem os valores certos, não fosse ele senhor de saber sempre o valor e preço de tudo. É dado ao detalhe, à minúcia. Quando reparam, já ele viu há muito. É todo ele lógica, razão, factos e certezas. Afinal só afirma ter certeza quando sabe que a tem. E a verdade é que tem sempre. É bússola, com ele não há caminhos perdidos nem desnortes. Mesmo que desorientado, ele arranja sempre uma estrada para percorrer e que o leva ao seu destino. Tem medos, mas a coragem fala-lhe sempre mais alto e, por isso, nunca deixa de ir, de fazer e de acontecer. Mesmo que a bagagem venha atolada de receios. É sensível, mas nem todos o conseguem ver. Porque estão cegos: basta olhar a forma como ele sorri quando a sua cadelinha, fiel companheira, lhe pede atenção. Ou a forma emocionada com que fala dela e de todos os outros animais. Gosta de velocidade, mas também de controlo. É cauteloso e assertivo, não ousa nem deixa que o pisem. 

Ele é um mundo de coisas maravilhosas. O meu mundo, na verdade. O único mundo que não me foge dos pés. Que não é cruel ou injusto. Pelo contrário. Olha por mim e ainda, ao fim de quase uma década, olha para mim como se eu fosse uma novidade. Cuida, protege, mima, abraça, ama. Ama verdadeiramente, dando sem nunca esperar receber nada em troca. Minto: espera sempre a mesma coisa. Duas mãos sincronizadas, ternas e meigas, fazendo trajetos e rotas pela sua pele. 

Obrigada, amor. Sabes que te adoro, não sabes? 

10
Out19

em modo de jacto

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o meu dia começou tão bem. dormi muitíssimo bem, abraçada pelo novo edredon quentinho. tive oportunidade de ver o dia nascer, o sol a acordar e o céu a transformar-se numa paleta de cores lindíssima. meditei, como faço todas as manhãs, e preparei-me para mais um dia de trabalho. quinta-feira, o primo da sexta. a sensação de que estamos mesmo quase a cortar a meta, mas ainda falta um último esforço.
gargalhadas em casa, miminhos no carro. chego ao trabalho sempre com um sorriso no rosto, porque acredito que ninguém merece levar com as nossas dores e dramas. "bom dia!" digo alto, em bom som, e com um sorriso generoso. para mim sorrir é a cafeína de que preciso para enfrentar mais um dia. lá vou eu, pelo corredor da empresa, a distribuir sorrisos e boa energia. assim custa menos, penso eu.
quando o trabalho efetivamente começa, nem sempre é fácil continuar com esta boa disposição. aliás, não é fácil, é praticamente impossível. só mesmo com muito esforço.
e depois há dias como o de hoje. o dia começa bem, maravilhoso, mas à medida que vai passando, não é apenas a energia que vai sendo consumida. é toda a satisfação, a vontade de fazer mais, de fazer melhor.
ontem corrigiram um erro meu. por norma, aceito as chamadas de atenção com exigência: a que tenho comigo mesma e com o meu trabalho. não há ninguém que se castigue e puna mais do que eu comigo mesma. mas ontem, surpreendentemente, não senti qualquer pressão vinda de mim. pelo contrário, aceitei tranquilamente, pacífica. e foi esta falta de interesse que ligou um alarme dentro de mim. porque eu nunca sou assim. sou comprometida com as coisas. dou sempre o meu melhor, não fosse o meu lema de vida "para ser grande, sê inteiro". por isso, quando dou por mim a contentar-me com ser medíocre, a nem sequer ficar chateada comigo mesma por falhar, é hora de fazer alguma coisa.
desde que estou neste trabalho, o lema tem sido "aceitas ou mudas", porque é certo que as empresas dificilmente mudam. ou aceitamos as coisas como são ou mudamos nós.
só que mudar, na situação atual em que me encontro, é muito complicado. apesar de trabalhar num local que suga tudo o que há de melhor nas pessoas, o meu emprego é estável, recebo bem tendo em conta o panorama nacional e da minha profissão, estou pertíssimo de casa, gosto muito dos meus colegas de trabalho e integrei-me muito rápido. às vezes penso que os motivos que existem para mudar são tão pequeninos. a questão é que, embora pequenos, são demasiado fortes e gritantes para ignorar. são pequenas partículas que vão contra todos os meus valores, tudo aquilo que acredito no que diz respeito à forma como se devem tratar as pessoas, como deve ser um bom ambiente de trabalho. e eu sou teimosa com estas coisas. sobretudo em tudo aquilo que diz respeito a pessoas. não consigo evitar ser assim.
o dia começou mesmo muito bem. quase todos começam. mas quando subo as escadas para o meu gabinete, a barriga começa a apertar, a contrair-se num pequeno feijão e, quando dou por ela, é difícil respirar. não é no sentido literal da respiração, é no sentido em que todo o ar do mundo parece insuficiente para aguentar o ambiente saturado, asfixiante e tenso em que passo a maior parte do dia, aliás, as melhoras horas do dia. quando regresso a casa, a disposição para o que quer que seja é quase nenhuma. os dias repetem-se numa rotina enfadonha, aborrecida, que ou é má ou muito má. e esta lufa-lufa quotidiana, o vício de estar sempre a queixar e resmungar do mesmo cansam. é por isso que sinto que tenho de mudar. e estou a escrever tudo isto para que o que sinto há tanto tempo venha cá para fora. para que se materialize em palavras. palavras que espero, um dia, escrever numa carta. a carta que ditará o fim de um capítulo e o início de outro: a de demissão.

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