O amor está nos detalhes. Na atenção dada às particularidades e peculiaridades que tornam cada pessoa única e apaixonante. Pelo menos com ele tinha sido assim: foram os detalhes dela, todas as pequenas características que a tornavam diferente de todas as pessoas que já tinha conhecido, que o fizeram apaixonar-se.
O que ele sentia por ela era um sentimento que ele nunca tinha sentido antes. Já tinha gostado de outras raparigas e beijado umas quantas, mas era tudo num plano carnal e imediato. Era meramente físico, um bom momento de convívio, chamemos-lhe assim, e que, depois de terminado, não voltava a merecer a sua atenção. Com ela era diferente. Sentia-se atraído por ela, tinha sido até o seu físico a chamar-lhe a atenção pela primeira vez, mas não queria passar apenas um bom momento, queria vários. Durante um longo período de tempo. De muitas formas e maneiras diferentes.
Ela era diferente de toda a gente. Diferente para melhor. Fazia-o querer ser melhor também. Porque ao lado dela, pela primeira vez na vida, ele sentia-se ameaçado. Sentia que poderia não ser suficientemente bom para ser a pessoa escolhida para estar ao seu lado. Logo ele, que sempre fora dono de uma confiança à prova de bala, indestrutível.
Ele, o senhor orientação, tinha-se perdido nela. No seu sorriso, no ondulado do seu cabelo, na curva que delineava o seu corpo, na sua voz, na sua gargalhada, na forma envergonhada como sorria para as fotografias, na sua paixão pela música, no seu talento para a escrita, nas dezenas de curiosidades que ela partilhava acerca das coisas mais bizarras e estranhas que ele já tinha ouvido. Eram todos aqueles detalhes e tantos outros que o faziam sair de órbita e gravitar num outro plano: o dela.
Soube quase instintivamente que ela seria, por um lado, a sua perdição e, por outro, a sua bússola orientadora. Era um pedaço de mau caminho na estrada em direção ao rumo certo, se é que isto faz algum sentido. Para ele fazia, porque racional como era, estudou todos os argumentos, factos e teoremas acerca da possibilidade de se deixar ir e embarcar naquela viagem alucinada a que chamam amor. Não se queria magoar, não se queria expor, não queria que ninguém lesse as emoções que existiam por trás da cortina opaca na qual se escondia. Mas a ideia de tudo isso, embora assustadora, não conseguia ser pior do que a ideia de a perder. Porque para um observador nato como ele, ele sabia que pessoas como ela eram raras e que, aparecendo uma vez, podiam desaparecer para sempre.
E assim foi. Deixou-se ir. Apaixonou-se. E, depois mais grave e mais profundo, amou-a. Nem ele sabia que era capaz de sentir algo tão forte e tão intenso por alguém. Era um sentimento de uma dimensão assustadora. Amava-a em todos os momentos, inclusive quando ela estava chateada e lhe virava as costas. Nesses momentos ainda a amava mais um pouco, porque divertia-se ao vê-la chateada. Amava todas as suas virtudes, não se cansava nunca de a elogiar, mas era por amar de igual modo os seus defeitos que tinha a certeza de ter encontrado a "sua" pessoa. Porque todas as imperfeições dela pareciam obras de arte, de tão pitorescas que eram. A teimosia, o coração acelerado, a mente hiperativa. Amava-a como ela era: sem tirar nem por.
Mas talvez o que mais amava nela era o amor que ela sentia por ele. A forma como ela o protegia contra tudo e todos. Como ela saltava em sua defesa, mesmo quando nem sempre tinha razão. O modo como se preocupava consigo, chegando até a ser chata, mas nunca queria saber disso: queria apenas saber dele. A sua presença. Era incapaz de não o ajudar, fosse qual fosse a tarefa. Estava sempre lá, na fila da frente, pronta para o ajudar. Da mesma forma que era a primeira a dividir as suas tristezas e multiplicar as alegrias. Ela fazia-o sentir amado, querido, desejado como nunca se tinha sentido antes. Ela nunca se cansava de lhe dizer como ele era maravilhoso e ele sabia que ela sabia o quanto ele precisava de ouvir isso. Porque o detalhe mais extraordinário dela era a sua capacidade de leitura do que ia dentro de cada pessoa. Ela lia-o sem ele precisar de dizer uma palavra. Ela simplesmente sabia o que ele estava a sentir e, consequentemente, o que ele precisava. Ela amava-o sempre, mesmo nas suas idiotices. Encontrava sempre um caminho para o perdoar, para compreender as suas atitudes, para não o julgar.
Duas pessoas que se amaram, que se amam e nunca deixarão de se amar. Têm crescido juntas, de mãos dadas, lado a lado. Descobrem todos os dias, juntos, o que há de melhor e de pior no mundo. Com a certeza de que, para o pior e no melhor, estarão sempre um para o outro.
Foram a cura um do outro: ele deixou-se amar e ela compreendeu que podia ser amada. Formando um só: a pessoa amada.